Pensei muito sobre o post de ontem e acredito que alguns pontos abordados podem não ter ficado claros. Abordo esses pontos a seguir.
Primeiro, é importante que fique claro que as evidências de estudos científicos devem auxiliar a análise em Educação, mas sempre colocadas dentro de um contexto. Acompanhei o trabalho desenvolvido por Ricardo Paes de Barros e sei a seriedade com que ele coordenou o estudo, mas algumas causalidades apontadas por ele e, principalmente, a magnitude do impacto dessas medidas que impactam o aprendizado dependem muito da dinâmica e do contexto em que ocorrem. As palavras do pesquisador podem dar a entender que pode haver uma receita (como uma de bolo) para solucionar todos os problemas da Educação brasileira. Mas não há! Acho que nessa linha de argumentação o post de Simon Schwartzman aborda o que eu estou tentando dizer.
Os controles que são utilizados em modelos matemáticos não captam todas as peculiaridades do mundo real, o que faz com que a dinâmica por trás de certos resultados seja muito importante de ser entendida. As pesquisas sobre duração do ano letivo analisadas no estudo de Paes de Barros, por exemplo, abordam sistemas educacionais que estão em um contexto muito diferente do brasileiro. O principal estudo analisado (Schooling and Test Scores: A Mother-Natural Experiment, de Marcotte) aborda o impacto de uma redução do ano letivo em escolas que foram impactas por tempestades de neve. Escolas, provavelmente, com condições de trabalho, currículo e professores muito diferentes dos existentes no Brasil. Mas, com base em estudos internacionais como esse, ele faz a afirmação que consta no vídeo do post anterior.
Vou tentar explicar por meio de alguns exemplos como às vezes a dinâmica por trás de um resultado é muito mais representativa do que o resultado em si.
Vários estudos no Brasil apontam que as políticas de formação continuada não trouxeram grandes ganhos no aprendizado dos alunos. Com base nisso podemos dizer que não devemos melhorar a formação dos professores? Ou devemos tentar melhorar as formações de modo com que elas sejam mais efetivas?
Algumas pesquisas no Brasil mostram que ser negro impacta negativamente o nível de aprendizado de um aluno. Com base nisso podemos extrapolar para qualquer outra região do planeta e dizer que ser negro poderá influenciar o nível de aprendizado de um aluno? Ou podemos entender esse resultado dos estudos nacionais como reflexo de uma dinâmica na sociedade e na escola em que negros talvez possam ser alvo de preconceitos, serem menos estimulados por professores ou até obter resultados mais baixos por questões ligadas à confiança ou à autoestima. Em um país em que a dinâmica da sociedade e das escolas é diferente a situação dos negros em relação ao aprendizado se comparada à situação de pessoas de outra cor / etnia pode ser completamente diferente.
Algo semelhante diz respeito aos resultados que apontam que meninos vão melhor em matemática e meninas melhor em leitura na escola. Por mais que possa existir um fator genético que explique esses achados, boa parte da diferença se deve ao fato de meninos e meninas serem estimulados a terem comportamentos diferentes e a terem uma dinâmica de aprendizagem diferente.
Embora não queira entrar no tema que foi alvo de grande polêmica entre os especialistas, estimar o impacto do aumento de dias no ano letivo brasileiro baseado em estudos internacionais é algo quase impossível de ser feito. Até por que para que esse aumento possa ser o mais efetivo possível deve-se haver um currículo escolar claro, um professor que domine os conteúdos e esteja estimulado, o conteúdo a ser desenvolvido nas aulas deve ser claro aos professores e estruturado, etc. Pois como deixou implícito Simon, infelizmente, não existem medidas milagrosas para que um sistema educacional possa ser bem sucedido.